Segundo informações, em Três Lagoas possui mais de 500 pessoas com autismo, porém a cidade não oferece condições para um tratamento adequado
A dona de casa Giseli de Araújo Vergete é uma mulher muito presente nas redes sociais, com algumas postagens que nos levam à reflexão de algumas situações do nosso cotidiano.
Uma dessa publicações chamou a atenção dos seus amigos e seguidores: um vídeo de pouco mais de 1 minuto que demonstra todo seu carinho e amor pelo seu filho Gui, de 15 anos, que é autista. Inclusive, foi essa postagem que serviu para pautar essa matéria.
A reportagem do Perfil News entrou em contato com ela, que concordou em conceder a entrevista, sem fazer nenhuma exigência ou omitindo alguma respostas. Pelo contrário agradeceu a oportunidade de expor a situação de forma bem transparente, contando suas preocupações, sua luta e seu dia a dia com o filho Gui, que completou 15 anos dezembro passado.
UM LEÃO POR DIA
“Eu mato um leão por dia, quando não matamos o leão de hoje, amanhã temos que matar dois”, exemplificou suas dificuldades diárias para cuidar do filho.
Há oito anos, Giseli está em seu segundo casamento, com Leonardo Vergete, Perito Criminal da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Tem quatro filhos: o Gui 15 anos, o Edu com 12 anos, Sérgio de 6 anos e a Maria Antônia de quatro meses. “Agora chega”, disse.
Devido ao concurso que seu marido prestou no Rio de Janeiro, ela teve que acompanhá-lo, transferindo residência de Três Lagoas, de onde é natural, para aquele estado onde residiu por cinco anos.
Com a flexibilização da carga laboral do companheiro, ele resolveu retornar para Três Lagoas, a fim de ficar perto dos amigos e familiares.
DIAGNÓSTICADO COM AUTISMO
Há oito anos, quando o seu filho Gui estava com 3 anos, ela estava gestante do seu segundo filho. Segundo Giseli, naquela ocasião, o Gui já apresentava o que foi convencionado chamar de estereotipias (balanço involuntário) e ecolalia (repetição de palavras). Por conta disso, ela o levou em Campo Grande, na AMA – Associação de Mães de Autistas, onde após passar por exames seu filho foi diagnosticado oficialmente ser portador de Autismo.
“Quando eu fiquei sabendo do diagnóstico eu chorei muito! Sofri um luto que durou uns 6 meses. Parei minha vida para cuidar da vida da dele, do Guilherme”. Eu pensei era lutar por ele ou morrer de depressão em casa! Então resolvi que valia a pena eu correr lutar para dar lhe qualidade de vida. A partir daí em busquei forças e inspiração diária para seguir minha fonte de desejos de dias melhores.
“Na época eu trabalhava para uma empresa terceirizada no Posto Fiscal. Embora minha qualificação seja de Tecnóloga em RH, lá eu digitava e lançavas as notas. Porém, tive que sair do emprego para dar dedicação total ao meu filho”, disse.
Segundo Giseli, seu filho tem um autismo focal que nada mais é quando o autista é focado em alguma coisa e fica naquilo sem parar. “O meu ama mapa! Ama rodovias fica vendo estradas o dia todo”.
QUALIDADE DE VIDA
Quando seu marido teve que mudar-se para o Rio de Janeiro, para dedicar-se ao concurso público, ela a o acompanhou. Lá aprendeu a lutar pelo autismo. Foi no estado fluminense que ela conheceu verdadeiramente a necessidade de inclusão. “Percebi que se tiver inclusão clínica, escolas para autistas, eles conseguem sim ter uma qualidade de vida”.
Hoje meu filho é alfabetizado, sabe ler e escrever. Recebe muito amor e carinho, inclusive do meu marido, que desde o princípio soube que eu tinha um filho autista, ele dá todo apoio, amor, carinho, suprindo todas as terapias que ele precisa. Isso dá qualidade de vida à ele.
Porém para dar lhe condições de tratamento adequado e com qualidade a um autista a pessoa precisa desembolsar por mês aproximadamente uns R$ 1.500 reais. Daí a pergunta: “mas como um pai de família assalariado conseguiria tratar de seu filho, se a vida já é dura né?”
BANDEIRA
É devido a essa dificuldade que ela empunhou a bandeira para lutar pelo problema. “Não temos uma política voltada para ao tema. Não temos especialistas para acompanhar os casos de autismo. É preciso cuidado, é preciso atenção. Amanhã, na ausência dos pais, como fica uma autista em situação adulta, que não é alfabetizada?”
Giseli conta que tem uma situação financeira definida. “Estou de um lado privilegiado. Eu fico em casa cuidando dos meus filhos, sem precisar trabalhar. Mas, como fica as outras mães, outras famílias que não tem condições para tratar seus filhos e futuramente inseri-lo no mercado de trabalho?
“É por isso que vou para a guerra, tentar por meios políticos que o autismo seja sim, em Três Lagoas tratado com urgência com empatia. Uma pessoa nessa situação, requer cuidados e atenção especial. Além do cuidados dos pais, mais ainda não é suficiente, requer ajuda profissional”, disse.
MÃOS AMARRADAS
“Temos escolas com mãos amarradas sem saber lidar com um autista, devida a falta capacitação de profissionais na rede de ensino. “Eu sonho com uma Três Lagoas com um modelo em inclusão real. Não falo pelo meu filho, porque ele vive bem, tem colégio particular, além de condições de tratamento. Eu falo grito e clamo pelos demais que não tem condições de receber um tratamento digno. Eu quero uma clínica escola para autista em Três Lagoas, e enquanto não conseguir, não vou desistir dessa luta!
De acordo com Giseli, em Três Lagoas existe mais de 500 casos de autismo, porém, a maioria não tem laudo. Conforme disse Giseli, um laudo fechado para autista não depende somente do Neurologista, mas de uma equipe multidisciplinar, com Psicólogos, Fonoaudiólogos, Terapeuta ocupacional. Só assim o laudo fecha oficialmente.
Existe em Três Lagoas um grupo de 209 mães de autista. “Mulheres que estão fazendo a diferença. Inclusive já somos reconhecidas como de utilidade pública!”, disse.
“Eu luto pela inclusão, então é isso que eu digo, escolas regulares apenas receberem pessoas autistas não basta! É preciso trabalhar o respeito com as crianças ditas normais. É preciso qualificar os professores. Por exemplo, a Apae tem profissionais qualificados ali dentro. Eu mesma conheço várias, inclusive sou amiga de muitas. Porém a Apae não inclui. Lá são todos iguais em suas diferenças”.
CHOREI DE EMOÇÃO
Um exemplo, meu filho autista estudando com seu filho não autista, e sendo respeitado. Ele aos 15 anos, nunca tinha sido convidado para uma festa de aniversário. Ano passado uma amiguinha do colégio que ele estuda (SESC) mandou um convite para ele. “Eu chorei o dia inteiro, não resisti a emoção, de tanta felicidade!”
Outra coisa que a sociedade tem que saber que o autismo é qualificado em três tipos: leve, moderado e autismo severo. “No caso do meu filho é moderado. Porém, mesmo assim eu trabalhei por ele. Tem uma vida social bacana! Em 2017 fomos pra Disney meu filho até entendia umas coisas em inglês. Olha quanta evolução.”
Porém, segundo ela, o autismo não tem cura, mas tem tratamento. Na minha opinião o melhor tratamento para um autista além de terapias regulares são; amor e paciência.
VÍDEO
E foi levada por esses dois sentimentos que a mão do Gui teve e ideia de gravar o vídeo que ilustra essa matéria. “O povo não gosta de ler, então eu tive a ideia de escrever várias frases que simboliza meus sentimentos e gravei o vídeo”.
Giseli contou que o vídeo teve nenhuma produção. Foi uma coisa simples. Ela gravou no escritório do seu marido. “Sentei e posicionei o celular. Gravei umas cinco vezes até dar certo. Inclusive a música de fundo foi ao acaso, Além do arco íris, de Luiza Possi’.