A petroleira chinesa Sinopec, sócia no Consórcio UFN-III (UFN3) que, na década passada, foi responsável pela construção da fábrica de fertilizantes de Três Lagoas, atualmente pertencente à Petrobras, teve de pagar pelo menos R$ 13,1 milhões a um fundo abutre, decorrente de uma dívida do início da década com uma empresa fornecedora de tintas.
A decisão que autoriza o fundo abutre a levantar os valores, segundo o Correio do Estado, foi validada no dia 5 de novembro pela 4ª Vara Cível de Três Lagoas, após uma decisão superior do desembargador Alexandre Bastos, de setembro, permitir que o Fundo de Recuperação de Ativos – Fundo de Investimento em Direitos Creditórios não Padronizados sacasse os valores que haviam sido depositados em juízo pela petroleira chinesa no processo de execução da dívida herdada do Consórcio UFN3.
Na época da decisão, Alexandre Bastos ainda não havia sido afastado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no contexto da Operação Ultima Ratio, que investiga um esquema de venda de sentenças. Bastos é um dos cinco desembargadores de Mato Grosso do Sul afastados preventivamente de suas funções por 180 dias devido à suspeita de envolvimento no esquema.
Os advogados da petroleira estatal chinesa ainda tentam uma reconsideração do desembargador ou de seu substituto, mas o fundo, sediado no bairro de Pinheiros, em São Paulo, tem pressa em levantar os valores depositados em juízo. A Sinopec argumenta que o processo ainda não foi transitado em julgado.
Fundos como este, que adquiriu a dívida da Ypiranga Tintas, uma empresa de Três Lagoas, são considerados “fundos abutres” por comprarem títulos no mercado de dívidas consideradas “podres”, mas que ainda são executáveis. Esse é o caso da dívida de R$ 11,3 milhões do Consórcio UFN3 com a empresa de tintas.
A decisão favorável à Ypiranga Tintas foi concedida pela Câmara Arbitral Brasil-Canadá, em janeiro de 2017. Em seguida, a empresa ajuizou uma ação de execução contra o Consórcio UFN3 e, solidariamente, contra a Sinopec.
ENTENDA O CASO
Ainda segundo o Correio do Estado, a dívida comprada pelo “fundo abutre” surgiu durante o processo de execução que tramita na 4ª Vara Cível de Três Lagoas. Inicialmente, todas as decisões foram desfavoráveis ao fundo, tanto na primeira instância quanto na 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça.
A reforma da decisão só ocorreu no início deste ano, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitiu o reexame da matéria, autorizando a desconstrução da personalidade jurídica da Sinopec, empresa em recuperação judicial no Brasil.
Foi então que o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul autorizou a penhora de dividendos e juros ao capital de empresas subsidiárias ou integrantes do mesmo grupo financeiro da Sinopec, no Brasil e em outros países. Desde então, o fundo abutre iniciou a corrida para levantar os valores.
MAIS EMPRESÁRIOS DE TRÊS LAGOAS TOMARAM CALOTE
Com a possível volta das obras da UFN3 (Unidade Industrial de Fertilizantes Nitrogenados), localizada na cidade de Três Lagoas, os empresários vítimas do ‘golpe’ bilionário deixado pelo consórcio ficam na esperança de um possível acordo com a Petrobras que possivelmente deve retomar a construção parada há dez anos.
Um ofício foi encaminhado para a Petrobrás que pretende retomar construção em Três Lagoas paralisada desde 2014, com aproximadamente 80% de conclusão.
O advogado Humberto Garcia de Oliveira, cujo o escritório representa 82 empresas prejudicadas pelo calote da Petrobras, conversou com o Perfil News. Ele adianta que busca ser ouvido pela empresa que divulga a retomada da obra juntamente com o município e câmara municipal.
Segundo o advogado, diversas empresas têm materiais e serviços dispostos na obra e não receberam, a exemplo de fundação de concreto, fiação elétrica, bem como serviços inerentes como lavanderia, alimentação, dormitório, uso de máquinas, etc. que estão na obra, mas não receberam.
“A empresa alega que o problema é das comerciadas que ajuizaram recuperações judiciais no estado do Rio de Janeiro e travaram os pagamentos por 30 anos sem qualquer correção. Conforme plano de recuperação judicial da Galvão Engenharia. Em verdade, as empresas interpuseram as recuperações de forma estratégica justamente para não pagarem a conta. Não é crível que a estatal chinesa Sinopec tenha dificuldades financeiras”, disse.
Outro destaque do advogado é que com a diversificação de ações judiciais, e entendimentos variados dos juízos e Câmaras do TJMS, existiram decisões contraditórias onde empresas de mesmo seguimento que prestavam serviços para o consórcio foram agraciadas com decisões em que a Petrobras foi responsabilizada e até já receberam da Petrobras os seus serviços. A exemplo de duas empresas do ramo de refeições, uma teve reconhecida a responsabilidade da Petrobras e outra não. Uma já recebeu e outro ficou refém da recuperação – 30 anos.
O grupo de empresas que o advogado representa busca ser ouvido e ter uma justa tratativa com a empresa Petrobras, que não pode deixar o haver sem composição. Entendem que se há materiais e serviços na obra que não foram pagos, devem ser adimplidos justamente.
“Existem concreto, cabos de elétrica, pré-moldados e etc. que não estão pagos, devemos receber em 30 anos sem correção?”, salienta o advogado.
Lançado em 2009, o consórcio UFN3 seria responsável pela construção da maior fábrica de fertilizantes do hemisfério sul. O consórcio era formado pelas empresas Petrobras, Galvão Engenharia e Sinopec.
As obras da unidade foram paralisadas em 2014, durante o auge da Operação Lava Jato. A Galvão Engenharia estava entre as empresas envolvidas no esquema de corrupção.
Atualmente, a Petrobras é a única proprietária da estrutura, paralisada há mais de 10 anos, com pouco mais de 80% das obras concluídas.
Neste ano, a Petrobras anunciou um plano de investimento de R$ 3,5 bilhões para finalizar a fábrica de fertilizantes nitrogenados.