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segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

MÚSICA: Baú de Raul Seixas revela novas facetas do caubói fora-da-lei da MPB

08/07/2003 08h13 – Atualizado em 08/07/2003 08h13

Coletâneas sempre foram uma saída fácil para as gravadoras em tempos de crise. É só juntar um punhado de sucessos já gravados, sortear a ordem e botar nas lojas. Mas o que é bom para as gravadoras nem sempre é legal para os artistas. Curiosamente, Raul Seixas, que não tinha muita paciência para cantar em todos os shows músicas como “Gita” e “Eu nasci há dez mil anos atrás”, desde a sua morte ganhou várias compilações com o objetivo único de retorno fácil. Um crime contra a rebeldia e a criatividade de Raulzito. Por isso, é bem-vindo o CD “Anarkilópolis” (Som Livre), uma espécie de lado B de sua obra, produzido por Luiz Carlos Meu Bom e Kika Seixas.

O CD foge do lugar-comum com canções pouco conhecidas, duos interessantes e a participação de músicos como Gilberto Gil, Pepeu Gomes, Sergio Dias, Chiquinho do Acordeon, Marcelo Nova, Roberto Frejat, Jackson do Pandeiro e outros. O que mostra que, se Raul não fazia questão de ser querido por todos, em contrapartida era respeitado, e muito, pelos músicos em geral. E mais, reafirma seu papel como precursor da mistura de ritmos nordestinos como o baião, o xote e o xaxado com o rock’n’ roll.

A música “Anarkilópolis”, achada em uma fita nos arquivos da gravadora no ano passado, deveria ter entrado no disco “Metrô linha 743”, de 1984. Não entrou, mas o refrão (“Eu não sou besta pra tirar onda de herói…”) seria reaproveitado em uma música bem diferente que viria a ser um dos últimos sucessos do roqueiro: “Cowboy fora-da-lei”.

Feita para a trilha da novela “O rebu”, de 1974, a atualíssima “Se o rádio não toca”, ganhou nova versão num disco-tributo, em 95, com o acréscimo da personalíssima guitarra de Frejat. É fácil identificar também a guitarra de Pepeu Gomes em “Pagando brabo”, assim como a de Sérgio Dias em “Por quem os sinos dobram”. Essa música, por sinal, é, juntamente com o “Rock das aranha”, as duas mais conhecidas do disco.

Quatro faixas trazem Raulzito acompanhado. Em “Muita estrela, pouca constelação” e “Rock’n’ roll” ele canta com seu último parceiro na música, Marcelo Nova. Wanderléa empresta sua voz para o gostoso xote “Quero mais”, pontuado pelo acordeon de Chiquinho.

Um achado é a gravação de Raul com Sérgio Sampaio da bizarra “Eu sou eu, Nicuri é o diabo”. A faixa foi extraída de um compacto de 1971 cuja gravação foi enviada para inscrição no VII Festival Internacional da Canção. No ano seguinte, Lena Rios defendeu a música nas finais e Raul conquistou o segundo lugar com “Let me sing, let me sing”.

O disco é interessante de uma forma geral e bom para se perceber que nem só da parceria com Paulo Coelho vivia Raul. Com Claudio Roberto, co-autor de “Rock das aranha”, ele fez belas músicas. “Que luz é essa”, uma letra bacana com arranjo e violões de Gilberto Gil, foi gravada em 1977 no disco “O dia em que a Terra parou”. Desse mesmo álbum foi pinçada “No fundo do quintal da escola”, que, ao lado de “Maluco beleza”, é a letra que melhor define Raul Seixas (“Eu sou o que sou porque eu vivo da minha maneira/ Só sei que eu sinto que foi sempre assim minha vida inteira”). Por essa inconseqüência e por inserir em sua música o brega e os ritmos nordestinos, mesmo sem tocar no rádio, Raul Seixas nunca deixou de ser um dos artistas brasileiros mais populares.

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